CELAC, muita fumaça para alinhar-se aos ianques

Sexta, 27 Janeiro 2023 16:12

 

A cúpula da CELAC aconteceu na última terça-feira, 24 de janeiro, em Buenos Aires. Foi uma cúpula marcada pela crise dos governos dos países que compõem o fórum, crises estas, políticas no contexto da crise mundial, a sombra da estagnação econômica e do recrudescimento das tendências militaristas a partir da guerra no leste europeu.

Em primeiro lugar, a cúpula assumiu uma posição de cumplicidade com a selvagem repressão do governo Boluarte no Peru, que já registrou mais de 60 vítimas fatais. Apenas o chileno Boric (depois de ter sido o primeiro a alinhar-se com Boluarte e com a política dos EUA) ensaiou uma denúncia muito morna, enquanto os demais líderes se alinharam com a orientação imperialista que tenta fechar a crise através da derrota da insurreição espontânea, protagonizada pela população trabalhadora e camponesa, através dos mecanismos das instituições estabelecidas do semi-Estado peruano. A presença na Cúpula da Ministra das Relações Exteriores do Peru, Ana María Gervasi, foi repudiada pelos autoconvocados residentes peruanos e pela esquerda em um ato do qual participamos. Mas limitar-se a isso faz com que se cubra o cenário mais amplo: é apenas a expressão mais brutal e dura de uma orientação geral em favor do imperialismo por parte dos governos da região.

Outro ponto notável foi a política ativa do governo brasileiro, com Lula à frente, para posicionar-se como líder de uma ordem regional, que lhe permita negociar com a Europa e os EUA o preço deste alinhamento. Para ele, a própria CELAC é uma organização muito ampla e difusa, por isso buscou em primeiro lugar o apoio do governo argentino na necessidade de desenterrar a UNASUL, através do resgate do moribundo MERCOSUL. Isso permitiria deixar de lado (para esses cipaios) os desconfortos caribenhos, incluindo Ortega, com foco na "sub-região" sul-americana. O lema de "ordem e progresso" tem um conteúdo: apoiar-se nos EUA e apoiar a política externa militarista de Biden. Não à toa, duas das principais discussões do fórum, a suposta moeda única SUR e a insolência de Lacalle Pou, trataram do problema da influência chinesa na região. O outro grande problema, o dos direitos humanos e da democracia, visa usar a Venezuela como moeda de troca agora que Biden e a Casa Branca foram forçados a negociar com Maduro sob pressão de um mercado internacional de energia tensionado pela guerra entre a Rússia e a Ucrânia.

Mais polido, o ministro da Economia do Brasil, Haddad, explicou claramente que, por enquanto, o único acordo entre Argentina e Brasil que existe é um financiamento de 366 dias por bancos oficiais às empresas de cada um dos países para operações bilaterais de comércio exterior. E foi explícito: isso permitirá às empresas brasileiras entrarem no negócio de gasodutos, do qual, caso contrário, seriam inevitavelmente deixadas de fora pela concorrência chinesa. Massa, seu homólogo argentino, indicou que esse mecanismo permitirá evitar um maior sangramento de reservas do Banco Central, por um ano, provavelmente pensando nas eleições. É claro que não se trata de uma integração de "nações" abstratas, mas da viabilidade de certos negócios a um punhado de monopólios brasileiros e argentinos, associados aos ianques e à UE.

As bravatas de Lacalle Pou, baseada na defesa da democracia e dos direitos humanos (embora não para o Peru), não acaba escondendo a defesa do TLC Uruguai-China, que é uma pedra no sapato da linha lulista. Por essa razão, Lula atravessou o Rio da Prata para tentar negociar a ordem de um acordo mais amplo entre o Mercosul como um todo e a China. Pôs a condição de assinar o acordo com a UE primeiro, mostrando não uma simpatia "eurocêntrica", mas às empresas burguesas às quais seu governo responde.

O convite para a cúpula ao governo norte-americano não deixa dúvidas de que essa tentativa, (porque por enquanto não é nada mais do que isso) de o Brasil se posicionar como um interlocutor privilegiado na negociação das sub-burguesias regionais com o mestre imperialista, tem o apoio de Biden. Os ianques sabem o que querem, tal como revelam as declarações escandalosas da chefe do Comando Sul, Laura Richardson, sobre os recursos estratégicos da região, como lítio, terras raras em geral, ouro, petróleo, gás e aquíferos. As negociações bilaterais (país por país, não por blocos) que Trump havia promovido, por sua vez, não só abriram brechas para a China integrar vários países da região à Rota da Seda, mas também geraram uma multiplicidade de conflitos e processos de desordem institucional que também impactam nas estruturas institucionais podres imperialistas. É verdade que a China está atualmente em sérios problemas econômicos como resultado da guerra e do ressurgimento da pandemia, mas é evidente que Biden segue Trump nisso e pretende empurrar para trás seu "concorrente estratégico" (a China) o máximo possível, e a sub-burguesia brasileira é postulada como o principal parceiro nessa tarefa. Não sem contradições internas, já que não podemos esquecer a ocupação dos prédios federais em Brasília realizada pelos bolsonaristas e com a permissão de setores das Forças Armadas e dos patrões.

 

Pelos Estados Unidos Socialistas da América Latina e do Caribe

 

O decadente renascimento dos anos 2000 encenado pelos governos da região tem como conteúdo uma tentativa de resistir à profunda decomposição dos semi-Estados latino-americanos e suas instituições, parte de uma situação mundial marcada pela decomposição geral do sistema capitalista em sua fase imperialista e pela assimilação (cada vez mais violenta) dos ex-Estados operários como a Rússia e a China. O avanço da penetração imperialista decompõe as instituições e torna os bonapartismos sui generis ainda mais farsescos. No entanto, o papel mais nefasto desses governos "semidemocráticos" é a condução do proletariado, por suas direções burocráticas, ao engano, que lamentavelmente têm o flanco coberto pelo centrismo trotskista, que se limita a propor uma linha democrática contra "a direita", "antifascista" ou, no máximo, "unidade anti-imperialista" sem propor um programa operário que permita ao proletariado se levantar como caudilho das nações oprimidas latino-americanas. Assim, as correntes da região, como a FT, LIS, ITU, LIT etc., levantam acriticamente a palavra de ordem "assembleia constituinte livre e soberana", que sustenta os movimentos em luta no Peru, e levanta a rejeição ao governo "golpista"...  para defender as instituições supostamente democráticas do país. Enxergam golpes, opondo a democracia à ditadura, em todos os lugares, quando na realidade a burguesia ainda não tomou esse caminho porque conta com as instituições, ainda que totalmente decadentes e em crise, dos semi-Estados para executar suas manobras contra as massas e apoiar suas ofensivas mais sanguinárias, exercendo a ditadura do capital. Isso não significa que não devamos levantar  o "abaixo Boluarte" no Peru, muito pelo contrário, mas não para ir em direção a uma saída dentro dos marcos da institucionalidade capitalista, mas para impor um governo operário e camponês baseado nas organizações dos trabalhadores e do povo pobre que imponha as medidas para atacar o imperialismo na região, expropriando as empresas de mineração e os grandes latifundiários, impondo o controle operário de indústrias e serviços estratégicos, convocando o movimento operário em todo o continente, especialmente nos EUA, a apoiar a luta contra o imperialismo em toda a região. Não há democracia na América Latina sem a revolução agrária e a expropriação de indústrias e bancos estrangeiros. Qualquer monopólio do comércio exterior, ou acordo cambial, ou nacionalização de bancos é uma farsa sem essas medidas baseadas em derrubar os inimigos de classe do poder, impondo a ditadura do proletariado. É claro que a própria dinâmica da luta de classes baseada na estrutura econômico-social da região levará à extensão do processo revolucionário a todo o continente, mas sem uma direção proletária consciente será a contrarrevolução imperialista que será capaz de estrangular nossa classe. Portanto, lutamos pelos Estados Unidos Socialistas da América Latina e do Caribe, preparando uma direção operária internacionalista. Para este fim, é urgente avançar na reconstrução da Quarta Internacional. Convocamos urgentemente as correntes que defendem o programa da ditadura do proletariado a uma conferência latino-americana para discutir o programa e as medidas políticas e organizacionais para avançar neste objetivo.

 

 

COR Chile – LOI Brasil – COR Argentina

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