GREVE DOS PETROLEIROS: É PRECISO ROMPER COM AS INSTÂNCIAS BURGUESAS E LEVANTAR A DEFESA DO CONTROLE OPERÁRIO DA PRODUÇÃO

Miércoles, 19 Febrero 2020 19:58

A greve dos petroleiros avança para sua terceira semana. Segundo a FNP Federação Nacional dos Petroleiros, atinge mais de 120 unidades da Petrobrás em 13 estados e envolve mais de 21 mil trabalhadores. É considerada a maior greve da categoria dos últimos anos. Em greve desde o dia primeiro deste mês, os petroleiros reivindicam a suspensão das demissões na Fábrica de Fertilizantes Nitrogenados do Paraná (Fafen-PR) oficializadas no dia 14 de fevereiro e suspensas por liminar judicial em 18 de fevereiro, com o fechamento da unidade. Cerca de mil trabalhadores diretos perderão seus empregos. Os petroleiros também reivindicam o cumprimento de outras cláusulas do Acordo Coletivo e o fim da política de preços dos combustíveis, implementada em junho de 2016, baseada na paridade internacional dos produtos no exterior e na flutuação do câmbio. Além disso, reivindicam o fim das privatizações de subsidiárias.

 Até o momento, esta greve é marcada pela total adaptação das direções às instâncias da democracia burguesa. A dinâmica da luta insere-se nas disputas judiciais e no apelo ao parlamento para forçar uma negociação com a empresa. Além disso, segue isolada em todo o país, sem nenhum chamado à unidade dos trabalhadores para construir a resistência contra os ataques lançados pelo governo capacho do imperialismo não só aos petroleiros, mas ao conjunto da classe trabalhadora.

Desde a sua deflagração, a Petrobrás recorreu ao Tribunal Superior do Trabalho para que suspendesse a greve. No dia 04 de fevereiro, o Tribunal determinou que 90% das atividades fossem mantidas, atendendo parcialmente à Petrobrás. A decisão judicial também proíbe que os grevistas impeçam o “livre trânsito de bens e pessoas” nas refinarias e plataformas, além de permitir a contratação de trabalhadores em regime emergencial. Após dezessete dias de greve, o mesmo tribunal decretou a ilegalidade da greve, determinando multa de R$500 mil diários e permitindo eventuais sanções disciplinares. Até o momento, todas as decisões foram, de forma geral, acatadas pela FNP e pela FUP que, inclusive, utilizaram de sua “docilidade” com a patronal como discurso ideológico para forçar uma negociação. Em todos os comunicados, os sindicatos reafirmam que não estão “atrapalhando e /ou dificultando o pleno funcionamento da Petrobrás” e que estão garantindo o abastecimento e o atendimento das necessidades básicas da população. Ou seja, apresentam uma greve sem piquetes e que não atinge o cerne da disputa entre capital e trabalho, que é a produção.

Na segunda semana da greve, dirigentes petroleiros foram ao Congresso pedir a mediação dos líderes das bancadas parlamentares para a abertura de processo de negociação com a estatal. Na última semana, com o prolongamento da greve e a aplicação de multas o corte de ponto, as direções foram pressionadas a convocar manifestações de rua e ações que atingem os lucros da empresa como a venda do gás de cozinha subsidiado para a população. Também são tentativas dos petroleiros de saírem do isolamento midiático da greve e buscar o apoio da popular. Considerando que, desde 2017, 1 milhão de domicílios voltou a cozinhar com lenha, a ação da venda do gás pela metade do preço tem forte apelo popular.

A Petrobrás nas disputas interburguesas

A Petrobrás espelha os processos de disputa interburguesas e a mudança na orientação do estado semicolonial brasileiro. Desde a “Lei do Petróleo” de FHC, os escândalos de corrupção que possibilitaram a varredura do PT do governo, a mudança na política dos preços dos combustíveis de Temer, até o amplo projeto de privatização do governo Bolsonaro; enfim, não é possível compreender a Petrobrás, nestes processos, sem compreender como se manifesta a forma de dominação burguesa no Brasil, assim como nos demais países semicoloniais. 

Pela dupla dominação presente nos países semicoloniais, a do capital estrangeiro e a da burguesia nativa dependente, por sua vez, do capital estrangeiro frente a um proletariado desenvolvido, se estabelece uma condição especial de poder estatal, a qual Trotsky definiu como bonapartista sui generis. “Na realidade pode governar ou convertendo-se em instrumento do capital estrangeiro e submetendo o proletariado com as amarras de uma ditadura policial, ou manobrando com o proletariado, chegando inclusive a fazer concessões, ganhando deste modo, a possibilidade de dispor de certa liberdade em relação aos capitalistas estrangeiros.” (Trotsky, 1939)[1]

Especialmente no governo Lula, através das concessões e isenções fiscais, a burguesia nativa explorou ao máximo esta relação com o Estado mas, por sua debilidade inerente, sujeitou os trabalhadores integrando os sindicatos ao aparato estatal. Com a Petrobrás, os sindicalistas foram elevados à administração da empresa, tornando-se representantes do próprio Estado. Dessa forma, apoiada na burocracia sindical, a burguesia nativa encontrava-se numa situação mais favorável para negociar com o imperialismo a exploração de seus trabalhadores, bem como de seus recursos, como o pré-Sal.

Desde a “Lei do Petróleo”, de 1997, a Petrobrás já não tinha o monopólio da exploração e refino petroleiro no Brasil. Após esta lei, o governo brasileiro começou a ofertar áreas exploratórias em leilões de petróleo e gás. Até 2018, o governo Lula foi o que mais adicionou área exploratória no país, 237mil , em sua maioria para empresas nacionais. Contudo, a política de preços controlada pelo Estado, dificultou a abertura de concorrência estrangeira e a Petrobrás manteve o domínio quase absoluto no atendimento da demanda nacional. Com a descoberta dos campos de pré-Sal, acirrou-se a disputa entre o capital estrangeiro e a burguesia nativa por sua exploração. O governo Dilma, já pressionado pela “luta contra a corrupção” (estratégia do imperialismo para alinhar-se com uma fração da burguesia mais alinhada aos seus interesses), abriu mão do monopólio da exploração dos campos do pré-Sal pela Petrobrás. A mudança na política de preços, baseada na paridade internacional, é implementada com o governo Temer, facilitando o caminho para o imperialismo avançar. Bolsonaro é o governo dessa mudança de orientação na relação do Estado semicolonial brasileiro com o imperialismo, acelerando o processo de privatização da Petrobrás.

O petróleo é nosso?

Além da adaptação da burocracia dirigente, esta greve é acompanhada pelas análises dos partidos e grupos centristas sobre o caráter “entreguista” do governo Bolsonaro, fruto do “golpe”, em oposição a governos petistas anteriores, de caráter mais “soberanista”, apesar dos limites da conciliação de classes. As políticas defendidas por essas correntes colocam como principal consigna de luta a “Petrobrás 100% estatal” e outras palavras de ordem que esbarram no mesmo estatismo. A estatização de uma empresa ou de um ramo da indústria compreende sua administração pelo estado burguês e, no caso do Brasil e demais países semicoloniais, em relação direta com o imperialismo em sua fase decadente. Portanto, a luta contra a privatização não pode ser uma luta pela total estatização da empresa, pois isso não significa que esteja nas mãos ou que beneficie de alguma forma a classe trabalhadora. Da mesma forma, a luta contra a privatização deve assumir um caráter anti-imperialista e que, por sua vez, não pode ficar circunscrita às fronteiras nacionais. Dever ser construída em unidade e solidariedade de classe com os trabalhadores da América Latina.

A defesa da “Petrobrás 100% estatal” vem acompanhada, como política defendida pelo centrismo, por “administrada democraticamente trabalhadores” e com “controle popular para servir aos interesses do povo brasileiro” (MRT) ou simplesmente pelo “sob controle dos trabalhadores” (LIT-QI) citando apenas alguns exemplos, já que não se diferenciam muito. É importante, nesse sentido, diferenciar a “administração operária de uma estatal” de uma política verdadeiramente revolucionária que defenda a tomada da Petrobrás e a imposição do controle operário da produção. Se a Petrobrás 100% estatal é uma empresa sob o domínio do estado burguês, defender sua administração pelos trabalhadores é defender a colaboração de classes e a formação de uma capa da aristocracia operária. “Se a participação dos trabalhadores na gestão da produção há de ser duradoura, estável, ‘normal’, deverá apoiar-se na colaboração e não na luta de classes.” (Trotsky, 1931)[2]

É preciso combater o reformismo e a política centrista no interior dos processos de luta que irrompem pela classe trabalhadora. Os revolucionários, devemos levantar a defesa da tomada da Petrobrás sob o controle operário como forma de exercer influência prática na produção petrolífera e, neste processo, forjar uma vanguarda operária que assuma as tarefas transitórias de um programa revolucionário.

Unificar as lutas e construir a Greve Geral!

A greve dos petroleiros, por sua importância política e econômica na luta de classes, não pode permanecer isolada pelas direções adaptadas e restrita às instâncias da democracia burguesa. O governo Bolsonaro já apresentou sua agenda de ataques e segue impondo-a sem grandes dificuldades. As reformas da Previdência e Trabalhista foram duras derrotas impostas aos trabalhadores sob o silêncio das direções. As reformas administrativa e fiscal são as próximas prioridades do governo e, neste momento, servidores estaduais de São Paulo estão em processo de luta contra a reforma da previdência em nível estadual, dentre tantos outros processos isolados de luta; e as direções propõem apenas o dia 18 de março como data para as mobilizações nacionais. Nessa conjuntura, é preciso romper com o imobilismo das centrais e defender um congresso nacional de delegados mandatários e eleitos na base para discutir um programa operário de saída da crise. É preciso levantar em cada sindicato comitês de apoio à luta dos petroleiros para que avance com independência de classe e em unidade com a classe trabalhadora, rumo a construção de uma Greve Geral por tempo indeterminado que coloque abaixo os planos do governo!

 

[1] TROTSKY, L. A indústria nacionalizada e a administração operária, 1939.

 

[2] TROTSKY, L. O controle operário da produção, 1931.

 

 

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