BRASIL: VOTAR NÃO É SAÍDA PARA OS TRABALHADORES

Friday, 23 August 2024 16:57

A instabilidade política crescente na América do Sul, com a crise venezuelana e, internamente, os processos eleitorais em curso, eleições municipais, as presidências para o Congresso (Câmara e Senado) e o Banco Central, delimitam a conjuntura política em que o Brasil estará mergulhado nos próximos períodos em meio às tendências abertas pelas guerras em curso e dinâmica depressiva da economia em nível mundial.

A escalada de tensão na Venezuela se arrasta, com a indefinição de poder entre as frações burguesas   capitaneadas por Nicolás Maduro e Maria Corina Machado/Edmundo González. A crise gera impacto na débil governabilidade dos governos de turno, sobretudo, Brasil e Colômbia, que insistem na cobrança das atas e optam pelas mediações diplomáticas, enquanto os EUA, num primeiro momento reconhecem a vitória de González, mas agora ameaçam reinstituírem sanções econômicas à Venezuela e recuando da posição para aguardar as mediações feitas pelo Brasil.

Os governos Lula 1 e 2 eram avalistas do chavismo, e toda sua retórica reformista em torno do socialismo do século 21.  Já a atual frente ampla Lula/Alckmin, um governo burguês, eleito para resgatar a democracia das “garras do fascismo”, e do “golpismo”, se vê encalacrado em relação à situação política venezuelana e não consegue dar conta de respondê-la. De um lado deve exercer o papel de serviçal dos interesses do imperialismo na América Latina e de outro responder internamente junto a sua base política mais próxima que defende a permanência de Maduro; o PT reconheceu a vitória de Maduro desde o primeiro momento, mas também ao amplo setor da base eleitoral que não tolera a contradição de o governo baluarte da democracia, vacilar ao não posicionar-se contra o regime venezuelano.

A duração dessa crise, começa a impactar as eleições municipais, o teatro do voto, já que o tema Venezuela é combustível para a polarização posta permanentemente no Brasil, que se alimenta dos discursos eleitoreiros de bolsonaristas e das esquerdas, “ditadura” x “democracia”, como se ambas não fossem faces da mesma moeda, isto é, formas de dominação da burguesia sobre a classe trabalhadora. Nesse sentido, apesar da intensa polarização política em grandes capitais, como em São Paulo entre Ricardo Nunes (MDB), apoiado por Bolsonaro, e Guilherme Boulos (PSOL) por Lula. Essas disputas marcarão toda a campanha eleitoral, vale afirmar que PT e PL, partido de Jair Bolsonaro, estão juntos em 85 cidades.

Outra faceta das eleições se dá em São Paulo com as candidaturas do centrismo, com os candidatos a prefeito e a vereador do PSTU em diversas capitais e o MRT, que se utilizando da filiação democrática da legenda do PSTU,  lança sua “bancada comunista”. Evocam a independência de classe para atuar através de um “programa revolucionário e socialista” por dentro das estruturas do sistema de poder da burguesia, nada revela mais o nível de adaptação ao regime. As eleições são a expressão maior do controle ideológico contra o avanço da luta de classes, é inconcebível o grau de desvio desses setores dos métodos de luta e organização próprios dos trabalhadores.

Como deflagradora da crise política avança a crise econômica. Recentemente, os índices macroeconômicos do 2º trimestre foram divulgados. No segundo trimestre de 2024, o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 0,9%. No acumulado dos últimos 12 meses, o PIB teve alta de 2,5%, sendo o melhor resultado para um trimestre encerrado em junho desde 2014, já a taxa de desemprego no Brasil caiu para 6,9%, esses dados que também revelam uma dinâmica de uma década atrás.

O governo e a mídia burguesa tentam surfar nesses dados, mas tais resultados se contradizem ante o número absoluto de desocupados que cresceu 6,7%, em relação ao trimestre anterior, atingindo 8,6 milhões de pessoas. Entre os que estão no mercado de trabalho, a taxa de informalidade é de 38,7%, dados do início do ano. O trabalho precário, sem carteira assinada e com baixos salários, atinge 40 milhões de brasileiros. 64 milhões sofrem de algum tipo de insegurança alimentar e 15 milhões passam fome. No Brasil, a renda média do trabalhador chega em 2024 valendo apenas 40% do salário-mínimo estabelecido pelo Dieese, já o salário-mínimo oficial vale apenas 20% do que estabelece o instituto. Isso explica a inadimplência recorde de 66,6 milhões de pessoas.

Recentemente, um novo relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) foi divulgado e revela que cerca de 20,4% dos jovens em todo o mundo estão fora do mercado de trabalho, os chamados “nem-nem”, jovens que nem estudam, nem trabalham. No Brasil, um diagnóstico inédito mostra que pelo menos 7,1 milhões de jovens entre 14 e 24 são também parte dessa nefasta estatística.

Como efeito direto, a barbárie avança em várias frentes, desde a violência nas periferias das cidades, ao massacre contra povos indígenas e quilombolas, à crise de moradia, à explosão dos moradores de rua e à insegurança alimentar. Portanto, o que está posto é que a Frente ampla que governa o país lança aos trabalhadores o engodo do Estado como solução de todos os problemas, ultrapassando a luta de classes e ofuscando, assim, o seu real caráter de classe, que é burguês, e, consequentemente, aplica um plano econômico que atende diretamente o capital monopolista, os bancos e especuladores do mercado financeiro.

O início de agosto marca a retomada das atividades do Congresso Nacional, mas o ritmo de trabalho deste semestre será condicionado pelas eleições municipais. As campanhas eleitorais possuem forte impacto no funcionamento do Congresso. Mesmo assim, o parlamento deverá pautar no segundo semestre temas com impacto direto na luta de classes, como a regulamentação da reforma tributária, além da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), a revisão das dívidas dos estados e a compensação da desoneração da folha de pagamento. Desta forma, a pauta econômica segue sendo fundamental para o governo cumprir as metas do arcabouço fiscal, que já contingencia as verbas para a educação, como exemplo. A crise permanente entre os três poderes amplia a debilidade da Frente Ampla para avançar com seus projetos de governo.

Contudo, está posto que não há grandes discordâncias quanto à pauta econômica, mas é importante lembrar, que para avançar com a aprovação de seus projetos, o governo teve de desembolsar aproximadamente 20 bilhões de reais em emendas parlamentares, e aí reside o foco de tensão entre os poderes.

Hoje, essa crise ganha contornos com as articulações, que correm em paralelo, para as eleições para as presidências da Câmara e do Senado, Arthur Lira e Rodrigo Pacheco deixarão os cargos no início de 2025, porém, no início de agosto, o ministro do STF, Flávio Dino, determinou o bloqueio das emendas pix até que o Congresso aprove novas regras para a liberação desses recursos, considerando critérios como “transparência, rastreabilidade e eficiência”. Lula tem criticado a tomada de assalto do orçamento do Executivo pelo congresso, e como Dino foi indicado por Lula para o STF, a relação de causa e efeito já foi feita pelos deputados. Lira, em resposta, destravou uma PEC apresentada em 2023, parada desde então. Trata-se de uma PEC que autoriza o Congresso a derrubar qualquer decisão da Corte, quando esse entender que feriu as prerrogativas da Câmara e do Senado. Contudo, um acordo para maior “controle” começa a ser costurado, em uma reunião no STF, membros da cúpula dos três poderes delinearam as bases para que o mecanismo das emendas não sofresse nenhum revés.

As pelejas políticas, expressam os limites que a Frente Ampla tem para governar, expressa a crise institucional da democracia burguesa que se aprofunda em todo o mundo, e no Brasil, expressam os efeitos da polarização vigente. Evidenciam como as várias frações burguesas disputam as pautas centrais, sobretudo, as econômicas.

É nesse aparato decomposto e em crise que as direções políticas e sindicais da classe trabalhadora canalizam sua atuação. Durante todo o primeiro semestre, estiveram recuados e em campanha visando se cacifarem para as eleições municipais, enquanto isso os governos de turno avançavam com as reformas e as privatizações. Vale lembrar que a cereja do bolo está a caminho, a Reforma administrativa tramita no congresso e o governo federal deve apresentar um projeto ainda esse ano. O tema em debate é a questão do tamanho do Estado, se mínimo, ou não, mas uma coisa os une, o ataque aos servidores públicos.

Diante desse cenário, temos evidenciada a necessidade da defesa da independência de classe como elemento central para a elaboração de políticas e definição de ações pelas organizações dos trabalhadores. Ao invés disso, as burocracias sindicais e as direções políticas reformistas se lançam na defesa de projetos eleitorais, deslegitimando e esvaziando os nossos métodos próprios de luta.

As organizações centristas se afastam cada vez mais das políticas revolucionárias e da independência de classe. O centrismo tem caminhado de vento em popa no terreno eleitoral da burguesia, no campo da ordem e regras da manutenção da propriedade privada dos meios de produção, sem arranhar o sagrado direito à propriedade privada. A cada eleição apresentam seus candidatos, restringindo-se no máximo ao voto crítico.

A política para os trabalhadores não pode ser definida pelas eleições, com a aquisição de bancadas nos parlamentos, e consequente disputa pela administração do estado burguês, alimentando a ilusão de uma “democracia pura”, cujo aparato estatal pudesse ser preenchido com determinado conteúdo de classe. Os ataques da burguesia contra o conjunto dos trabalhadores estarão na ordem do dia, independentemente do prefeito eleito para “administrar seus negócios” nas cidades.

A tarefa central para a classe trabalhadora só pode passar pela necessidade de construção do partido revolucionário que dirija a derrubada do estado burguês e imponha a nossa ditadura de classe. Não há saída para os trabalhadores dentro da democracia burguesa. Por isso, defendemos o VOTO NULO.

Aos revolucionários é fundamental erguer em cada sindicato e organização estudantil a necessidade de realização de assembleias que exijam dos sindicatos e centrais a construção de uma saída operária da crise e de enfrentamento aos ataques; que coloque abaixo as Reformas Trabalhista, Previdenciária,  Administrativa,  do Ensino Médio, além do projeto das Escolas Cívico-militares em curso; que levante a luta pela escala móvel de horas e salários e a necessidade de expropriação dos expropriadores. É necessário também que, a partir de nossas estruturas, organizemos a autodefesa contra os ataques protofascistas da pequena burguesia bolsonarista e, principalmente, contra o braço armado do estado burguês.

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